Os dados do TSE demonstram uma mudança no perfil dos votantes locais, apontando uma retomada no crescimento do público apto a votar, dos eleitores com 16 e 17 anos, da população com nome social, e daqueles que possuem alguma deficiência ou mobilidade reduzida
Lucas Barbosa Lopes, Marcela Aguilar
Em ano de eleições, a importância e a necessidade do direito ao voto ficam mais evidentes. No Brasil, o voto segue sendo obrigatório, contudo, menores de idade, com 16 ou 17 anos, e pessoas analfabetas ainda podem escolher entre votar ou não nas eleições. Outra questão que ainda é realidade no país é a possibilidade de dispensa para pessoas cuja deficiência prejudique ou impossibilite o ato de votar.
No entanto, dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) apontam que o número de votantes tem se modificado na cidade de Mariana. A análise referente ao público eleitoral local, bem como a comparação com os números dos últimos anos, reflete não somente o comportamento da população, mas também situações que precisam ser melhoradas no desenvolvimento da cidade.
O número total de eleitores corresponde, atualmente, a 80% dos cidadãos em Mariana, e refere-se a 49.745 habitantes. Números que expressam uma maioria engajada, com um público mais diverso e com um maior acesso à educação básica. Além disso, os dados revelam um interesse crescente da população em exercer o direito ao voto, mesmo em casos em que a dispensa é também resguardada por direito.
Eleitorado com 16 e 17 anos
Para as eleições de 2022, os números da cidade demonstram que o público eleitoral de 16 e 17 anos triplicou em comparação aos números da eleição de 2020. Esse foi um comportamento observado em todo o país após uma intensa campanha de conscientização, envolvendo o Tribunal Superior Eleitoral e influenciadores digitais, a fim de alertar a população sobre a data limite para emissão do título e sobre a importância do voto para o atual momento político.
Em todo o Brasil, de 2020 para 2022, o número de jovens votantes, menores de idade, subiu de 1.391.949 para 2.114.946. Em Mariana, por se tratar de uma cidade de pequeno porte, é expressivo que o público eleitoral de 16 e 17 anos seja composto atualmente por um total de 738 pessoas tendo em vista que há dois anos a cidade contou somente com os votos de 292 menores de idade. Os números demonstram um crescimento percentual acima da média nacional, com 152% de aumento no eleitorado de 16 e 17 anos, o que demonstra um desejo em ter uma participação ativa na situação política da cidade, em concordância com o restante do Brasil. Se, em 2020, somente 0,5% dos eleitores de Mariana se enquadravam nessa categoria, nas eleições de 2022 a cidade vai contar com 1,5% de eleitores com idade entre 16 e 17.
Em contrapartida, não será a eleição de Mariana com o maior número de menores de idade exercendo o direito ao voto, tendo em vista que nos anos de 2012 e 2016 a cidade superou o indicador do ano atual, contando com 933 e 760 votantes, respectivamente. De toda forma, são indícios de que o interesse político está retornando entre os jovens e de que os menores de idade estão buscando por melhorias para a sociedade.
Grau de instrução
Os números demonstram um outro movimento significativo quanto ao público votante de Mariana no que diz respeito ao grau de escolaridade. Por mais de 10 anos, o maior eleitorado da cidade foi o de pessoas com o ensino fundamental incompleto, ou seja, desde 2012, a cidade contou com uma maioria votante que não havia concluído o ensino fundamental. Os dados indicam que por todos esses anos, cerca de 30% dos eleitores se encaixavam nesse grau de instrução, tendo em 2012 atingido o maior percentual, com 37% do eleitorado sem ter concluído os estudos em nível fundamental.
No que diz respeito às eleições de 2022, pela primeira vez, desde 2012, o número de votantes em Mariana com ensino fundamental incompleto representa um indicador inferior a 30%, alcançando 29,93% dos eleitores, percentual relativo a 15.210 pessoas. Tais dados refletem a situação educacional da cidade e apontam uma estagnação no que diz respeito ao incentivo e à continuidade dos estudos da população como um todo.
Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), as matrículas de estudantes do ensino fundamental de Mariana, em 2021, totalizaram uma quantidade aproximada de 8,3 mil alunos. Neste mesmo ano, as matrículas referentes aos estudantes do ensino médio se aproximaram de 1.890, somente. A quebra na continuidade do ensino é um comportamento que se reflete na população votante da cidade, que segue por muitos anos sendo composta majoritariamente por um público com pouco acesso à educação.
O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica, em Mariana, é outro dado que indica uma necessidade de atuação das políticas públicas educacionais nessa frente, tendo em vista que o município possui uma nota de 6,2 referente aos anos iniciais do ensino fundamental, e 4,5 referentes aos anos finais. Essa redução de quase dois pontos reflete um comportamento local que tende ao abandono dos estudos após o ingresso no ensino fundamental.
Nos anos de 2012 e 2014, por exemplo, os números de eleitores analfabetos representavam aproximadamente 3%, e os que possuíam curso superior completo não passaram de 2,7%. O fato das duas métricas terem se mantido tão similares aponta a necessidade de melhorias no acesso à educação para todos.
Foi somente na eleição de 2016 que a porcentagem de votantes que possuem o ensino superior completo superou a porcentagem de votantes analfabetos na cidade. Naquele ano, os eleitores analfabetos quantificaram 3,07% da população e os graduados no ensino superior totalizaram 3,49%. Já em 2018, esse percentual voltou a cair entre os graduados, que representaram uma diferença de 0,69% de eleitores a menos em relação aos votantes sem conhecimento de leitura ou escrita.
Já em 2020, o crescimento do eleitorado com ensino superior completo voltou a ocorrer, se mantendo também no ano de 2022, e alcançando 5,42% dos votantes com graduação completa. Atualmente, em 2022, os eleitores com uma formação superior quantificam duas vezes o número de votantes que não sabem ler ou escrever, situação que por muito tempo na cidade foi oposta. Isso demonstra que, apesar dos altos índices de votantes analfabetos ao longo dos anos, uma parte do eleitorado tem se tornado mais engajada com a continuidade dos estudos e alcançado o ensino superior.
Eleitores com deficiência
O direito ao voto, mesmo sem a obrigatoriedade, deve ser resguardado a todos aqueles que possuem a intenção de exercê-lo. Isso diz respeito a garantir acessibilidade a todos para a efetivação do voto. Os números analisados em Mariana demonstram que o eleitorado com deficiência cresceu mais de seis vezes entre os anos de 2012 e 2022.
Contudo, sabendo que a acessibilidade ainda é uma questão pouco explorada e pouco desenvolvida em Mariana, bem como em diversas regiões do país, um grande número de pessoas deixa de exercer seu poder devido às condições precárias de locomoção e acesso aos locais de votação. Para os cidadãos com deficiência ou com condição que dificulte a mobilidade, existem poucos recursos do Estado que forneçam o acesso digno para esse importante momento.
Luís Fernando Ferreira, morador da Praça Gomes Freire, localizada no centro de Mariana e usuário de cadeira de rodas, afirma: “muitas pessoas com deficiência ainda deixam de votar por conta da falta de acessibilidade nos locais de voto”. “Eu, por exemplo, encontro dificuldades pela falta de rampas no local por serem construções do século passado e acho que essa é nossa maior dificuldade”, disse ele, que vota na Casa de Cultura do município.
Ao ser questionado sobre projetos no município que garantam o acesso de pessoas com deficiência aos locais de votação, ele afirmou desconhecer tal iniciativa ou ação que ajude esses eleitores a chegar nas suas zonas eleitorais.
Luís, que enfrenta as dificuldades de locomoção todos os dias pelas ruas de Mariana, reafirma a necessidade de espaços preparados para que todos tenham acesso às urnas: “O que falta mesmo é a acessibilidade, não apenas para deficiências de locomoção, mas para todas as deficiências e também para os idosos, que enfrentam dificuldades no momento de votar”.
Nome social
Outro fator de inclusão que se tornou realidade no Brasil é o direito ao voto com nome social, destinado à pessoas transexuais. Desde 2018, em todo o país, pessoas trans podem incluir o nome social no título de eleitor, assim como na lista de votação na seção eleitoral.
Em Mariana, esta parcela de eleitores vem crescendo gradualmente com o passar dos anos. Também iniciada em 2018, porém com uma quantidade muito reduzida quando comparada com as eleições atuais, o número de pessoas que votam com nome social no município mais que triplicou desde as últimas eleições, passando de três para dez pessoas
Apesar dessa parcela ainda significar um número muito reduzido entre os votantes, esse crescimento simboliza representatividade e conquistas de direitos LGBTQIA+ nos âmbitos político e civil.
Eleitorado Total
O eleitorado total do município também teve um crescimento para as eleições de 2022, contando com 1.154 cidadãos a mais aptos a exercerem o direito ao voto. Tal crescimento é perceptível desde 2012 na cidade, tendo em vista que em todas as viradas de ano eleitoral, Mariana contou com adições ao seu público votante.
Foi somente nas eleições de 2018 para 2020 que a população apta a votar teve um crescimento de 569 cidadãos, apenas, quantidade muito abaixo da média padrão para a região, que representa um crescimento de 1.313 pessoas a cada ano. Por mais que o índice do ano atual ainda se mantenha abaixo da média esperada, por 159 pessoas, é um indicador importante de uma possível retomada da conscientização e priorização de todos frente aos interesses políticos.
É através do voto que todo cidadão consegue buscar representatividade e resguardo dos seus direitos, e, por isso, é crucial que o público eleitoral seja um reflexo daquilo que a cidade de Mariana almeja para a sua gestão. É por meio não somente da decisão de votar, mas também das condições adequadas para a realização da votação, que a democracia é concretizada. Por isso, é tão importante que ocorra um acréscimo no público apto a votar a cada ano, bem como um público mais diverso e inclusivo, e que possua o acesso básico à educação. Dessa forma teremos uma unidade votante que de fato represente os interesses coletivos e individuais de Mariana.
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