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EJA: Uma segunda chance para quem quer voltar a estudar

Atualizado: 8 de ago. de 2023

Cerca de 24 mil pessoas não possuem o ensino médio completo em Ouro Preto. A Educação de Jovens e Adultos é, para muitos, uma nova oportunidade para voltar aos estudos


Escola municipal Monsenhor João Castilho Barbosa durante o período de aulas do EJA | Foto • Enrico Bertoni

Enrico Bertoni ,Tulio Dutra e William Santos


Imagine a seguinte situação: você começa a trabalhar aos 9 anos, mais tarde, se casa, tem filhos, os vê se formando na escola, mas durante todo este tempo os seus estudos foram deixados de lado, assim como seu sonho de se formar em direito e ser perita. Eis que aos 48 anos a vida mudou graças à uma segunda chance de retornar à escola por meio da Educação para Jovens e Adultos (EJA). Essa é a história da moradora de Ouro Preto Aparecida de Paulo Urbano, 48 anos, que hoje estuda na turma do 4º período do ensino fundamental.


Aparecida de Paulo Urbano, 48 anos, em um dia de aula da EJA | Foto • Enrico Bertoni

Aparecida faz parte das 2.698 pessoas de sua idade que não conseguiram completar os estudos do ensino fundamental, equivalente a 48,79% da população de 45 a 49 anos na cidade de Ouro Preto, de acordo com os dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Assim como Aparecida, existem pessoas que também buscam uma melhoria na vida ou no trabalho por meio dessa oportunidade que é proporcionada pela EJA.


De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em 2021, 31,2% da população brasileira entre 16 e 85 anos não possuíam ensino fundamental completo, ou seja, 52 milhões de brasileiros e brasileiras. Em Ouro Preto, essa porcentagem era de 32,92% da população, ou 24.544 pessoas, de acordo com dados do TSE, compilados pela professora da EJA, Maria do Carmo Ferreira dos Santos, da Escola Monsenhor João Castilho Barbosa. O site QEdu, que reúne dados educacionais sobre o Brasil desde 2012, registra que 837 estudantes estavam matriculados na EJA, em Ouro Preto, durante o ano de 2021.


O que é a EJA?


A Educação de Jovens e Adultos é uma modalidade de ensino voltada para pessoas a partir dos 15 anos que buscam retornar aos estudos, podendo ser oferecida por escolas municipais e estaduais desde os anos iniciais do ensino fundamental até os anos finais, além do ensino médio. As séries são ofertadas em ciclos semestrais, em que cada semestre equivale a um ano.

Em Ouro Preto, duas escolas municipais oferecem a modalidade EJA no ensino fundamental: a Monsenhor João Castilho Barbosa e a Professora Haydée Antunes. Além das turmas EJA nas escolas municipais, Ouro Preto também possui três escolas estaduais que oferecem o Ensino de Jovens e Adultos: Escola Estadual de Ouro Preto, conhecida como Polivalente, Escola Estadual Dom Pedro II e a Desembargador Horácio Andrade.


A diretora de Inclusão, Diversidade e EJA da Secretaria de Educação de Ouro Preto, Silvana Evangelista Braga da Silva, explicou que não existem turmas EJA nos distritos porque não há número de alunos suficientes para atender essa demanda.


As motivações


Os dados sobre a modalidade EJA, em Ouro Preto, foram inseridos no sistema unificado de informações educacionais da Prefeitura - o Sonner - somente a partir de julho de 2021, de acordo com a diretora do Núcleo de Inclusão, Diversidade e EJA, Silvana Evangelista. Desse modo, foi possível compilar os dados sobre a quantidade de alunos da EJA - anos iniciais -, por exemplo, na escola Monsenhor João Castilho Barbosa. Até julho deste ano, eram 139 pessoas e, apenas um mês depois, em agosto, esse número caiu para 49 matrículas.


Já para a professora Maria do Carmo Ferreira Dos Santos, que dá aulas de ciências para turmas da EJA na Escola Monsenhor João Castilho Barbosa, os motivos para que um aluno desista de estudar envolvem problemas estruturais da própria escola. São alguns desses motivos: a grade de matérias não ser ideal para os estudantes; os horários não atenderem os alunos; o corpo docente não estar preparado devidamente para dar aula nesta modalidade; e falta de transporte no período noturno, além de obrigações familiares e dificuldades financeiras.


Giovanna da Conceição Juventino, 43 anos, abandonou os estudos após a escola fechar por um tempo e decidiu tentar mais uma vez, em busca de um futuro melhor. Ela começou a trabalhar ainda jovem para ajudar os pais e voltou à escola pelo programa, na Monsenhor João Castilho Barbosa, graças ao incentivo de seu patrão, para que parasse de trabalhar em casa de família e arrumasse um emprego com algo que gostasse. Seu sonho é se formar em direito. “Se Deus quiser, vou ser uma advogada e lutar pelos pobres na minha profissão”, afirmou.


Giovanna Conceição Juventino, 43, durante a aula no EJA | Foto • Enrico Bertoni

Os danos


A Escola Monsenhor João Castilho Barbosa possui, atualmente, 122 alunos matriculados na EJA, mas a frequência não chega a 15%, ou seja, apenas 22 pessoas frequentam as aulas, de acordo com a diretora da instituição, Rosângela Guimarães. Entre os motivos, ela destaca a locomoção dos alunos, que pode ser difícil, e também o cansaço, visto que a maioria, por trabalhar durante o dia, no período da noite não tem disposição para comparecer à escola. O transporte escolar municipal atende alunos dos distritos de Santa Rita, Amarantina, Santo Antônio do Leite, Rodrigo Silva e Antônio Pereira. Entretanto, distritos como Miguel Burnier, Bandeiras e Serras do Cardosos não conseguem ser beneficiados, de acordo com a diretora Silvana.


Escola municipal Monsenhor João Castilho Barbosa durante o período de aula EJA | Foto • Enrico Bertoni

Atualmente eles estão fazendo a busca ativa pelos alunos, ligando em suas casas e perguntando os motivos pelos quais não estão indo às aulas, porém, muitas vezes, nem as ligações são atendidas. “É muito preocupante. A gente fica pensando: onde estão esses alunos? Porque saber que eles estão por aí, a gente sabe. Só não estão na escola”, complementou Rosângela.


Para melhorar a presença nas aulas, a escola busca criar maneiras de atrair os alunos como, por exemplo, a “Sexta Legal”, quando é exibido um vídeo ou quando levam um convidado para fazer uma palestra no local, com o tema “Para a vida”, que busca mostrar ensinamentos que eles possam utilizar em seus trabalhos ou em sua vida particular.


Os sonhos


Além de Aparecida e Giovanna, outros estudantes da EJA também falaram sobre seus sonhos e suas vivências. Guilherme da Silva Santos, de 18 anos, durante o dia trabalha como garçom em um restaurante de Ouro Preto e de noite estuda. Ele recebe um salário mínimo por mês , dividido entre ajudar sua mãe nas contas de casa e guardar um pouco em sua poupança, coisa que aprendeu nas aulas de educação financeira. Seu sonho, depois que se formar na EJA, é ser técnico de Informática e trabalhar com computadores.


Já Luciano Henrique dos Santos Bento, de 19 anos, atualmente apenas estuda, disse que tem muita dificuldade de prestar atenção nas aulas, mas que tem certeza que vai conseguir não só se formar na EJA como também seguir seu sonho, que é trabalhar com robótica.


Algo notório entre os estudantes é a positividade, a certeza de que eles vão conseguir passar pela EJA e seguir seus sonhos, ter um trabalho, salários dignos e, principalmente, uma vida melhor. Grande parte dos alunos que participaram das entrevistas relataram que trabalham de segunda a sexta-feira, e às vezes aos sábados, equilibrando essa dura rotina com os estudos noturnos. Essa garra demonstra que enxergam a EJA como uma segunda chance, percebendo que suas lutas cotidianas não só servem para eles, mas também inspiram outras pessoas que, assim como todos nós, anseiam por oportunidades.


Para conhecer mais sobre as histórias contadas na reportagem acesse nosso Podcast “Segunda Chamada” no Spotify.








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